Por Alexandre Honorato Oliveira.
Para poder entender os princípios hermenêuticos de Rudolf Bultmann é necessário que antes de qualquer coisa, tenhamos-nos a compreensão de como o pensamento deste grande teólogo do século XX foi sistematizado e de como as suas posições foram defendida ao longo do tempo, fazendo aqui um resumo de sua vida e de suas obras.
Rudolf Bultmann nasceu em 20 de Agosto de 1884 em Wefelstede (Oldenburg), sendo filho de pastor protestante. Fez os estudos superiores em Tubingen, Berlin e Marburgo, laureando-se em 1910, sob a orientação de Johannes Weiss, sua tese defendida tinha por título “O estilo da pregação paulina e a diatribe cínico-estoica”. Nos estudos secundários foi colega de Karl Jaspers. Em 1916 foi professor extraordinário em Breslau, indo em 1920 para Giessen e Marburgo em 1921.
No inicio de seus estudos Bultmann se definia como “teólogo liberal”, ele foi formado no clima da teologia liberal, más não demorou muito para aderir à teologia dialética, já em outubro de 1921 redigiu uma carta a Hans Von Soden em que indicava seu rompimento com a teologia liberal. Em 1924 publicou o artigo “A teologia liberal e o mais recente movimento religioso” em que afirmava o antropocentrismo da teologia de seus mestres. O objetivo do artigo era promover uma nova orientação para a revista liberal Christliche Welt. Neste período dialético, Bultmann escreve vários artigos entre 1925 e 1928, onde aparecem os princípios metodológicos que nortearão sua pesquisa. Publica em 1925 o artigo “O problema de uma exegese teológica do Novo Testamento” nesta época além de por fim em seus antigos ideais teológico, torna-se um grande crítico da teologia liberal, por considerá-la “uma reflexão que diviniza o homem e desvia-se do seu objetivo teológico”. Essa crítica de Bultmann à teologia liberal, marca sua presença cativa na teologia dialética. Publica ainda, em 1928, “O significado da ‘teologia dialética’ para a ciência neotestamentária”. Porém sua obra clássica “Jesus”, publicada em 1926, já marca os princípios que ele usará no importante “Manifesto da demitização” de 1941. Este manifesto, redigido quatro vezes que se completam no decurso de vinte anos, traz a síntese da reflexão bultmaniana que abordaremos mais detalhadamente aqui.
Para Bultmann, o conteúdo do Novo Testamento é mitológico, os relatos escritos pelos membros da igreja primitiva eram puros contos mitológicos, sendo “a imagem de mundo neotestamentária” (Weltbild) muito distinta daquela realidade. A imagem mítica do mundo fez com que os autores do Novo Testamento, Paulo, Pedro, João, Mateus, João Marcos, Lucas entre outros, registrassem os seus testemunhos numa linguagem que considera como conto Mitológico “a encarnação de um ser preexistente”, “a morte expiatória”, “a ressurreição”, “a descida aos infernos”, “o retorno no final dos tempos” e a “escatologia dos eventos finais”. Todos estes elementos precisam ser demitizados, para ser extraída a mensagem genuína dos textos neotestamentários.
Segundo o artigo[1] do professor Brian Gordon Lutalo Drumond Kibuuka docente da Faculdade de Teologia Wittenberg no Rio de Janeiro. A tarefa da demitização é:
“criticar a imagem de mundo do Novo Testamento (tarefa negativa) e esclarecer a verdadeira intenção do mito, encontrando assim a verdadeira intenção da Escritura (tarefa positiva). Para assim fazer, é preciso dar uma interpretação, fazer uma atualização, tornar evidente ao homem moderno a mensagem do Novo Testamento. Bultmann afirma que isto pode ser feito pela interpretação antropológica ou existencial (posteriormente chamada de hermenêutica existencial).”
As principais críticas feitas a Bultmann são de que a sua pré-compreensão heideggeriana[2] torna-se uma “camisa-de-força” (Barth), que não se deve demitizar os fatos da história (Cullmann) e que absolutizar o “Weltbild” da ciência moderna e adotar uma discutível concepção iluminista de mito desqualifica seu projeto (Jaspers).
É importante destacar que, na compreensão de Bultmann, a história da Literatura Cristã Primitiva é um projeto fadado ao fracasso, bem como a compreensão da “verdade” histórica sobre o homem Jesus. Para ele não é possível ambos projetos, mas que eles não são relevantes, porque o que importa de fato para a Igreja é crer em Jesus de Nazaré, o Cristo.
A visão que Bultmann tem dos Evangelhos é que eles contêm o que ele denomina “‘unidade de pregação’ da Igreja primitiva”. Para Bultmann os Evangelhos não é a história de Jesus, mas é a sistematização das formas literárias primitivas por meio das qual a Igreja primitiva prega Jesus – pregação esta denominada kérigma.
Portanto, para Bultmann, a fé é algo que não está no âmbito da história (passada e inexistente), mas no âmbito da própria existência (presente e real). Cada unidade de pregação, cada forma literária, cada parte do Evangelho é um chamamento a uma mudança na existência, uma chamada à decisão. Nesta chamada, o fundamental não é a história, mas a proclamação e a resposta a mesma.
[1] KIBUUKA, BRIAN G. L. DRUMOND. Sobre Rudolf Bultmann. Artigo extraído do ”blog” Estudos no Novo Testamento disponível em: http://estudosnonovotestamento.blogspot.com/2007/02/ sobre -rudolf-bultmann.html acesso em 15 mar 2008.
[2] Rudolf Bultmann foi catedrático na Faculdade de Teologia de Marburg, onde foi aluno de Martin Heidegger, professor de Filosofia na mesma universidade.
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