- Um Retrato das Igrejas dos Nossos Dias
(Pr. Wilson Franklim)
Postagem original em: Jornal da Obra
Neste artigo meu alvo é identificar, no pensamento teológico
atual e praxis eclesial, a presença e o impacto que a teologia pós-moderna vem
exercendo nas igrejas atualmente. Embora tenha consciência de que essa
influência está em todos os campos da vida humana, neste ensaio apenas
abordarei a questão religiosa. O que é pós-modernidade?
I. A Pós-modernidade
1.1. Breve histórico – A modernidade fracassou em muitos
aspectos, primeiramente acreditava na ilusão do progresso ilimitado da
humanidade através da tirania da razão. Os iluministas concentraram seus
esforços na educação do povo, os marxistas esperaram que as lutas de classes
conduzissem a uma sociedade reconciliada, os capitalistas colocaram todas suas
fichas na revolução tecno-industrial. Mas para todos esses idealistas as
previsões falharam e assim a primeira metade do século XX resultou ser um
imenso cemitério de esperanças com duas grandes guerras no continente que se
dizia iluminado.[1] Tal realidade trouxe críticas pesadas: Michel Leiris chegou
a afirmar que a modernidade converteu-se em “merdonidade”.[2]
Diante do fracasso da modernidade surge por volta de 1960
uma nova cultura: a pós-modernidade com a ideia nietzscheana do eterno retorno
do igual, onde o fator preponderante deixa de ser a razão para ser o
sentimento. Nessa nova cosmovisão todas as ideologias têm o mesmo valor, assim
como as pessoas.
1.2. Desta forma, a pós-modernidade torna-se um movimento
multidisciplinar, cujas características principais são: afirmação de que não
existem verdades absolutas ou fixas. A verdade é plural e relativa, sendo a
produção do meio através da interação do individuo com o seu ambiente.
1.3. Igualdade de valor para todas as filosofias, ideologias
e modo de vida. Na visão da pós-modernidade todas as “verdades”, de todas as
religiões, têm o mesmo valor, é o chamado pluralismo inclusivista. Prevalecendo
a ideia de inclusão social das classes oprimidas e menos favorecidas. Em outras
palavras, foi a ideologia pós-moderna que abriu as portas para as hermenêuticas
das “minorias”: a teologia feminista (ordenação feminina), a teologia da
libertação, a teologia homossexual…
1.4. Nessa esteira ideológica vem o ideal do politicamente
correto. Especialmente não questionar a crença do outro. A razão para esse “respeito”
é que a “verdade” de uma pessoa é tão boa quanto à “verdade” da outra. Não se
questiona o pecado, o sexo fora do casamento, o homossexualismo… Por outro
lado, quem não aceita esses ideais, p. ex.: os salvos que creem na Bíblia como
verdade absoluta, são acusados de radicais, fundamentalistas, e pasmem: até de
se afinarem aos ideais malignos da assassina kukluxklan…
II. O Impacto da Pós-modernidade na Teologia: A Substituição
da Verdade Bíblica Absoluta Por Verdades Relativas
Os conceitos da pós-modernidade são muito sutis em face de
suas afirmações muito próximas da verdade, razão pela qual se infiltrou com
muita facilidade nas escolas seculares, seminários e em quase todas as igrejas.
Na teologia seu impacto foi devastador, vejamos:
A pós-modernidade acabou com o ideal de se chegar ao sentido
único do texto Sagrado. Agora, a interpretação da bíblia é dependente quase que
exclusivamente do leitor. Observe que havia algo preditivo nas palavras de
Brunner quando afirmou na primeira metade do século XX: “a teologia protestante
de nossos dias está num estado de rápida dissolução”[3]. De fato, grande parte
dos eruditos evangélicos tem sido unânimes em sua preocupação com o declínio da
consciência teológica. Hunter[4] destaca o desinteresse pela precisão doutrinária
e pela santificação como marca da igreja pós-moderna.
David Wells[5], ex-catedrático do Seminário Teológico
Gordon-Conwell, fala das mudanças negativas, em relação à interpretação
bíblica, acontecidas na segunda metade do século XX ocasionadas por uma
acomodação ao pensamento pós-moderno.
Vale lembrar, que no passado, os crentes buscavam no
Evangelho a resposta para os problemas da humanidade. Em nossos dias, muitas
publicações evangélicas, ao contrário, mostram claramente o vácuo
bíblico-doutrinário que invadiu as igrejas e principalmente os seminários
confessionais. Neste ponto, a teologia pós-moderna abandonou definitivamente a
crença na inerrância das verdades bíblicas, para adotar claramente, sem nenhuma
preocupação em esconder, as frágeis “verdades” relativizadas do pós-modernismo.
Apenas como exemplo desta tragédia no meio acadêmico,
transcrevo a declaração estarrecedora que o exegeta Klaus Berger[6] faz para
descrever seu método hermenêutico pós-moderno: “temos o seguinte princípio em
comum com a teologia da libertação: não interpretar o mundo a partir do
evangelho… Mas expor o evangelho a partir da situação (entre outras da situação
social)”[7]. Essa declaração mostra que o seguidor desta cosmovisão não vê e
nem explica a situação caótica do mundo através da Verdade Absoluta da Bíblia,
antes impõe sobre as Escrituras uma interpretação em conformidade com mundo.
Klaus justifica sua posição afirmando que se deve “abrir a possibilidade para
uma postura mais livre” em razão da “necessidade incontornável do diálogo com a
filosofia moderna”[8]. Observe aqui o ideal pós-moderno do politicamente
correto.
Conclusão – Os Resultados de Uma Teologia Relativista
Ao se retirar a superioridade da Bíblia Sagrada, através de
interpretações que se ajustem às “necessidades” e culturas de comunidades não
salvas, o Verdadeiro Evangelho deixa de ser comunicado, e sem Evangelho não há
salvação. A consequência direta desse desvario é um cristianismo do tipo clube
social, morto e com muitas dúvidas e confusões existenciais nos corações de
seus “consumidores”…”…
Nas Igrejas – Na pós-modernidade não é somente Deus que
retorna; assistimos a um autêntico boom do esoterismo e pragmatismo: misticismo
exagerado (auto ajuda mística: com unção com óleo, água “ungida”, lenços e toalhas
mágicas, jargões de guerra…) e o uso indiscriminado de metodologias seculares
de caráter empresarial. Assim, a teologia pós-moderna tornou-se uma combinação
sincretista de várias ideologias e métodos. Nesta esteira, cada pastor passou a
interpretar a Bíblia de forma particular dentro da perspectiva que melhor
“atenda” as suas igrejas apenas como comunidades religiosas ou empresas e não
como corpo de Cristo (alguns até bem intencionados, mas totalmente
equivocados). Infelizmente há também aqueles que pensam mais em si próprios.
Constatação – Não é sem razão que não temos, na atualidade,
uma unidade nas Igrejas em relação ao estudo bíblico, vida cristã e
principalmente em termos de adoração. Essa teologia relativista abriu as portas
para que muitos pastores promovessem mudanças radicais nas Igrejas sob a falsa
alegação de que as Igrejas são soberanas e DEMO-cráticas (na realidade,
soberanos são esses pastores). E todos usam textos bíblicos para justificarem
tamanha usurpação do Legado Histórico, e o fazem com a interpretação
pós-moderna dos textos. Impondo o significado que mais lhes interessa.
Exemplos trágicos da relativização – Já existe em algumas
igrejas pastor que se auto “ordenou” bispo e até após-tolo. Sem contar que
vários pastores já ordenaram suas esposas ao pastorado feminino em um flagrante
ato de nepotismo através da relativização do texto sagrado (junto veio a
disforme contratação de familiares). A continuar nessa linha de pensamento
pós-moderno, o próximo passo é a introdução da teologia gay, considerando que
as portas já estão abertas com a teologia pós-moderna relativista…
Em outras palavras, as igrejas, atualmente, mais parecem
ilhas independentes, cada uma de uma forma e tamanho, existem até as vulcânicas
em plena erupção. Infelizmente prestes a naufragar no mar das falsas “verdades
relativas”.
A resposta Bíblica – Pode-se imaginar o apóstolo Paulo
pregando esse evangelho, relativizado, confuso, e politicamente correto? – Pelo
contrário, Paulo afirmou que o poder do Evangelho está na pregação da Verdade
(Cristo), e não na sua capacidade de absorver a cultura popular.
É urgente que voltemos à simplicidade da fé cristã, e da
submissão à Soberania de Deus. Que resgatemos os princípios bíblicos de
inerrância da Palavra de Deus. É urgente que resgatemos nossas instituições de
ensino teológico, primeiramente colocando a frente pessoas comprometidas com a
Bíblia. Homens salvos forjados na fé, que creem na inerrância bíblica de forma
inalienável. “Destruindo os conselhos, e toda a altivez que se levanta contra o
conhecimento de Deus, e levando cativo todo o entendimento à obediência de
Cristo” (II Co 10.5 ACF).
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Notas:
[1] Dicionário do Pensamento Contemporâneo. São Paulo,
Paulus, 2000, p.609.
[2] Ibidem, p.608
[3] BRUNNER, Emil. Teologia da Crise. São Paulo, Novo
Século, 2000, p.27.
[4] HUNTER,
James D. Evangelicalism: The Coming Generatin. Chicago, University of Chicago
Press, 1979.
[5] WELLS,
David. NO place for truth. Michigan, Grand Rapids, 1993, p. 123.
[6] O Livro de Klaus, citado abaixo, deixa sérias dúvidas
quanto a sua crença na inerrância da Palavra de Deus.
[7] BERGER, Klaus. Hermenêutica do Novo Testamento. São
Leopoldo, Sinodal, 1999, p.11.
[8] Ibid p.11